terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Muitos e bons sonhos em 2012.


“[...] os olhos são a janela da alma [...]”  Mateus 6.22


Essas palavras foram ditas pelo Mestre em torno do sermão do monte. Ele falava predominantemente para gente sem fé no futuro; gente pobre, em sua grande maioria, e absolutamente inculta; gente maciçamente analfabeta; crianças à margem da escolarização; mulheres desprezadas e indignamente tratadas como objetos de uso e desuso; pessoas que desconheciam o sentido da palavra respeito. Falava a prostitutas, zelotes, publicanos, escravos, indigentes, cegos e paralíticos. Falava aos leprosos, tuberculosos, e tantos outros doentes considerados endemoninhados, gente, que, segundo os religiosos fariseus, não repousara a graça e a bênção de IAVÉ. E, por isso mesmo, acreditavam que se faziam revelar de forma inconteste as marcas do seu pecado, latente no corpo através das muitas chagas e doenças repulsivas.


Essa gente feia, pobre, marginais sociais às dezenas, por vezes centenas, e comumente milhares, insistiam em acreditar que algo de bom e surpreendente poderia visitá-los. Havia uma “mania” nessa gente, acho que influenciadas pela “histérica” visão do profeta Isaías, o qual certa vez dissera que um dia brilharia a Luz no caminho do mar, que era composto pelas cidades mais pobres da Palestina, que margeavam o mar galileu: Cafarnaum, Betsaida, Caná, Decápolis, Nazaré, Galiléia e Gerasa.


É engraçado como os pobres são parecidos no mundo todo, e em qualquer tempo, de hoje ou de ontem, sempre acreditam, sempre esperam que algo lhes possa ocorrer, algo de místico, de mágico, de libertário. E talvez seja esse o ingrediente propício para gente mal-intencionada se aproveitar de algo tão singelo que é a crença nascida da fome da alma por dias melhores, por um futuro digno, um sono tranquilo, sorriso na face e dias cingidos de esperança.


Acho que Jesus se sentia pressionado pelo grito que essa gente trazia silenciado no peito. Acho mesmo que ele sempre soube que não poderia fazer muita coisa, não poderia mudar-lhes a sorte, não poderia desenhar-lhes um novo futuro, como um tolo pintor desenha seus anseios numa tela.


O Logos, ele sim, pode libertar vidas, mesmo presas atrás de grades existênciais que não se dissolvem facilmente. Vejo os olhos do Senhor marejarem pela força da confiança no Logos de Deus, que ao encontrar gente morta, desnuda, esfarrapada, ressuscita-a, vocacionando ao novo, surpreendente em direção à Vida que todo que é nascido Dele merece e pode viver.


Os olhos são as janelas da alma..., Ele sempre soube que não poderia mudar a sua materialidade, mas, sim, a lógica da alma desprovida de sonhos, engravidando-os do Logos, que do nada pode criar, e das trevas transformar em luz que não se apaga.


Meu mestre sorri e chora, mas agora de alegria e prazer em ver gente sonhando, olhando para dentro, encontrando razão para viver e lutar; os olhos são a janela da alma...


Algumas coisas na vida são realmente nossas, pouquíssimas coisas nesta vida podemos dizer que ninguém pode nos tomar, arrebatar de nós, e acho que uma dessas pouquíssimas coisas são os nossos sonhos, nossas inspirações, nossos vôos.


Era jovem quando Leonardo Boff começou a ser processado pelo Vaticano, o que culminaria em sua expulsão da Igreja Romana, mas numa certa publicação do JB, enquanto Boff estava punido e proibido de falar, falar para a imprensa, falar como padre, falar como cidadão, falar como ser humano que era e é, o JB – para os mais jovens, JB era o melhor jornal que esse país já produziu, hoje só online – estampou uma charge que nunca mais esqueci, era uma grande gaiola fechada e dentro um minúsculo pássaro voando sorridente.


Quem pode roubar nossos sonhos, quem?


Acho que Jesus estava dizendo àquela gente miserável que ele não teria como solucionar todos os seus problemas, mas que mesmo em meio a seus dramas, e não eram poucos, elas poderiam sonhar, enxergar, ver.


Estou aqui cheio de visões, cheio de sonhos, cheio de esperanças, mesmo em meio a limitações que insistem em me intimidar e desestimular. Mas olho para o Mestre Santo e o ouço falar-me ao pé do ouvido: sonhe, sonhe, sonhe, pois toda vez que você sonhar, estará mais perto da concretude de seus devaneios.


Portanto, convido-o a sonhar, sermos “marias”, pedirmos para ser engravidados pelo Logos de quem procede a verdadeira vida que não se extingue.


Muitos e bons sonhos em 2012.